segunda-feira, 21 de maio de 2012

Um Poema na Vila - em Coruche

O tema era "O Montado, um Lugar Poético" na sessão de 4 de Maio.
Li este poema que descobri, do poeta Francisco Bogalho:


CORTICEIROS


No silêncio ardente do dia parado,
Há lida de gente no denso montado.


Há troncos despidos, já lívidos, frios,
E troncos que esperam, em funda ansiedade,
Com gestos convulsos, de sonhos sombrios,
Em dor e silêncio, por toda a herdade.


Os pés descalços trepam ágeis,
Sobem...
O machadinho crava-se e segura,
Como se fora um croque de abordagem,
O homem
A subir, na faina dura.
E lembra-me, assim vistos a distância,
- Os vultos a trepar pelos troncos gigantes –
Como em contos de infância,
Cornacas dominavam enormes elefantes.


Que os troncos majestosos e inermes
Têm o ar daqueles paquidermes,
Lentos, laboriosos, resignados. –
Desses trágicos braços contorcidos,
Que mais tarde, a sangrar,
São a gala maior desta paisagem,
E, agora, estão gelados, confrangidos
Pela tortura sem par,
No pino da estiagem,
Vão homens rudes, escuros e suados,
Lenço metido sob o chapéu largo,
Arrancando aos bocados,
Em férrea luta obscura,
Com qualquer coisa de febril e amargo,
A epiderme dura.


-Oh, velhas árvores dos montados!

E há pasmo na canícula.
E há silêncio, de assombro, na paisagem!


-Troncos dilacerados!...

Francisco Bugalho
Poesia


E de Produção Própria, feito exclusivamente para esta ocasião:



LAVOISIER E A NATUREZA

O Lavoisier, que entre outras coisas afirmou,

“Que na Natureza nada se cria, nada se perde,

Tudo se transforma”, acabou por perder a cabeça.

A culpa foi da Revolução Francesa,

Que não aceitava que ele estivesse do lado dos ricos,

Cobrando impostos aos pobres.

Mas a cabeça dele transformou-se na do Condorcet

Quando resolveram fazer-lhe a estátua.

Portanto não se perdeu completamente.


O Lavoisier, era capaz de ter razão.

O chaparro transforma-se em sobreiro,

Vários sobreiros transformam-se num montado.

Os sobreiros depois de desmontada a sua casca

Permitem a transformação da cortiça que a compõe

Em artefactos de várias formas, feitios e finalidades,

Que permitem pôr rolhas em garrafas,

Revestir pavimentos, e até vestir de forma bem isolada

As roupas que os designers conceberam.

Digam lá se isto não é poético? Tão poético é,

Que é proibido por lei o abate dos sobreiros,

Excepto quando outros valores mais altos se levantam…

Tais como os imobiliários, a eventualidade de aeroportos,

Ou umas tortuosas interpretações da defesa ecológica…

E claro, o Lavoisier continua presente, já que também

Os tribunais tomaram a defesa dos interesses dos poderosos

Contra os interesses da protecção do ambiente,

Ganhou Portucale, contra Portugal…

Carcavelos, 2 de Maio de 2012

Eduardo Martins

2 comentários:

  1. e contra as injustiças?...pela minha parte só podem contar com o voto, riscos e a poesia!
    abraço
    cpfeio

    ResponderEliminar
  2. Contra as injustiças? Não consigo perceber a que te queres referir... Então a justiça não funciona optimamente???
    A não ser que te estejas a referir a qualquer outro país para aí de qualquer outro mundo...

    ResponderEliminar