quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

NOITES COM POEMAS

Nas "Noites com Poemas" de Fevereiro, em que o tema foi "Cruzando os Mares do Tejo ao Zambeze", a miscigenização foi tal, que até o titulo do poema que eu escrevi e li estava todo imbricado... 


TEZE E ZAMBEJO – POR OCEARES E MANOS CRUGANDO E NAVEZANDO



A história já é antiga

E vai-se repetindo.

Os mares foram cruzados

Em busca das várias Índias



Onde estava o petróleo

Que ainda não havia,

E que tinha por nome pimenta,

Canela, gengibre, açafrão, mostarda, sei lá!



Para lá chegar, muitas lágrimas

Foram deitadas ao mar (salgado)

Mas o Fernando Pessoa

Já se encarregou de falar disso…



Foram as caravelas Tejo fora

Até o Mar Atlântico enfrentar,

E no Cabo das Tormentas

Boa Esperança descobrir.



Índico acima, ao longo da costa

De África foram subindo,

E porque o calor e a sede eram intensos,

Na foz de um rio fizeram aguada.



E esse Rio passou a ser dos Bons Sinais,

E lá deixaram um padrão e fortaleza,

 E tentaram comunicar com os nativos,

Que estranharam estas gentes.



De outras cores, de outras roupas

De outras falas, que tentavam

Com dificuldades fazer-se entender

Por gestos, e alguns sons mais guturais



Como se vê já vem de muito longe

O jeito inato dos portugueses

Para se fazerem entender em todo o lado

Quanto mais não seja gritando…



E ás vezes fazendo trocadilhos com os nomes…



Eduardo Martins

Fevereiro de 2012

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

SUZETE OLIVEIRA

A minha Sogra, morreu no passado dia 25 de Janeiro de 2012.

Aqui fica a minha homenagem.



D. SUZETE

Maria Suzete Nina Dias de Oliveira

31 de Maio de 1923 - 25 de Janeiro de 2012





A Ana e o Tó Zé chamavam-lhe Mamã.

Eu que era apenas genro, chamava-lhe D. Suzete.

E tive e tenho grande admiração por ela.

Era uma Dona de Casa, no sentido clássico do termo.

Viveu para o marido, os filhos e a casa.

E na casa, principalmente para a cozinha,

E para o gosto de experimentar novas receitas…

E sendo filha única, também apoiou a mãe, D. Leónia;

Os filhos casaram e saíram;

O marido sofreu, e ela sofreu com ele, e ele morreu;

E a mãe, devido à idade também partiu.

A casa ficou, e ela nela.

E começou finalmente

A gerir e a viver a sua própria vida.



Inscreveu-se na Universidade da 3ª Idade;

Foi “adoptada” por um grupo de professoras reformadas,

Fez passeios com elas

Em Portugal e pela Europa;



Tomava notas e guardava folhetos e recortes,

Sobre tudo o que lia, via ou ouvia,

Nas viagens, nas revistas, na TV, na rádio,

Sobre todos os assuntos que achava interessantes,

E que depois comentava connosco;



Telefonava dizendo que podíamos ir buscar

“Uma coisinha que tinha estado a fazer

Para o almoço dos netos, ela achava

Que eles talvez gostassem,

Mas também devia dar para nós…”



Encantava-se a ver as montras de moda

E a fazer apreciações sobre a roupa

E o modo como as pessoas se apresentavam,

“Muito bem vestidas, muito bem penteadas…”

Como aliás ela própria fazia questão de andar…



Guardava as facturas de tudo o que comprava,

Anotava as variações dos preços para os mesmos produtos;

Nas costas das facturas dos restaurantes onde íamos com ela,

Tecia considerações sobre a qualidade da comida e sobre o serviço;



Começou a visitar antiquários e casas de velharias,

E a chamar especialistas lá a casa,

Para fazer avaliações dos objectos que lá havia,

E que ela considerava que eram valiosos.

Certamente para ter noção do património

Que iria deixar aos filhos…



Fez férias connosco muitos anos,

Em Portugal, e pela Europa fora,

E recolhia sempre toda a informação que podia

Que depois organizava cuidadosamente no regresso a casa;



Mas as doenças que já a minavam

Foram tomando conta dela, e diminuindo-a fisicamente,

Retirando-lhe a mobilidade, provocando-lhe dores terríveis.

Amputaram-lhe uma perna, ficou ainda mais dependente,

Mas a cabeça continuava lúcida e sempre atenta.



Teve a grande alegria de ainda conhecer os bisnetos,

O Gustavo que gostava muito dela,

E a Violeta, que é bastante mais nova,

E com quem infelizmente, não chegou a privar muito.



Nos últimos dois anos esteve internada

No Centro Psicogeriátrico N. Senhora de Fátima,

Das Irmãs Hospitaleiras, na Parede,

Onde teve todos os cuidados médicos, de enfermagem,

E sobretudo de carinho das irmãs, e do restante pessoal.



Mas convivia bastante mal com o ambiente

De degradação das capacidades psicológicas

Que notava na maior parte das internadas.



O maior prazer que tinha era ser levada

A lanchar, ou pelo menos a passear

Até à rua, a ver montras e outras pessoas.



Quando lhe foram detectadas metástases no cérebro,

Não lhe foi dado mais do que um mês de vida.

Viveu quase mais um ano.

Certamente de grande sofrimento,

Mas de muito pouca queixa.



A partir de certa altura deve ter deixado

De ter interesse em viver, pelo estado de degradação

Física em que se sentia de dia para dia.

E não quis ser mais pesada para ninguém.

E deixou-se morrer.




Eduardo Martins
Carcavelos, Fevereiro 2012

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Café Poema

O tema era "Cartas de Amor e outros dias".

Foi uma sessão bem divertida e concorrida.

A minha contribuição foi esta:



DECLARAÇÃO



Se o Álvaro, o de Campos,

Um dos habitantes de Fernando Pessoa,

Lá tinha as suas razões

Para escrever que:

 “Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.”



Mas também, para acrescentar que:

“Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas”.



Quem sou eu, que nem sequer

Sou habitante de Fernando Pessoa,

Para não concordar?



E assim, declaro que concordo

Com tudo o que foi afirmado

Por Álvaro de Campos.



E com o contrário também.

Eduardo Martins
Carcavelos, Fevereiro 2012