segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Outubro, quase a acabar, o verão de S. Martinho quase a chegar...

Desta vez foi de mais, ou melhor, de menos...
Tenho andado entretido por outras bandas, e a produção poética nem tem sido por aí além...

Aqui vão as mais recentes, ou seja, de Julho para cá...



INCÊNDIOS E MORTICÍNIOS

 

Norman Mailer escreveu sobre

“Os Nús e os Mortos”,

Quando as guerras eram outras,

E as circunstâncias diferentes.

 

O título veio-me à memória,

Sabe-se lá porquê.

Porque isto anda tudo ligado,

Ou porque ando a ler

O Jorge Luís Borges,

E as suas Ficções,

E o Aleph, e o Zahir,

E as Bibliotecas infinitas

De improváveis e misteriosas origens…

 

Pensei em “Os Queimados e os Mortos”,

Mas “Incêndios E Morticínios”,

Pareceu-me menos evidente…

Porque para evidências, já temos que chegue…

 

Este ano, desde a abertura da época

Dos incêndios florestais,

Já morreram quatro bombeiros.

Ou, sendo politicamente correcto,

E cumprindo as quotas de género,

Duas mulheres, jovens,

E dois homens, um mais velho,

E um jovem, voluntarioso,

Como voluntários eram todos,

Aqueles que aderentes a corporações

De Bombeiros Voluntários,

Avançaram para combater

Incêndios nas descuidadas matas nacionais,

Ou nas propriedades Particulares

Daqueles, que não cuidam delas,

E só se lembram,

Não das Santas Barbaras

Quando faz trovões,

Mas sim quando os fogos

Chegam às suas barbas,

Da “obrigação” de os bombeiros

(Ou o Estado, ou as Câmaras,

Ou as Freguesias…),

Defenderem as suas propriedades

Privadas, com cuja manutenção

E limpeza nunca se preocuparam,

Ou porque acreditam que a desgraça

Só acontece aos outros,

E deixam o mato crescer e secar e chegar

Até junto às casas onde vivem e têm

 

 

Os seus animais domésticos,

E as suas alfaias e os modos

De subsistência do dia a dia,

Ou porque já não vivem lá,

E nem sabem o que lhes pertence,

E só o descobrem quando

O incêndio lhes entra pela porta dentro.

 

E aí vêm lamentar-se (legitimamente?)

Da perda da sua propriedade,

Porque os bombeiros não chegaram

A tempo de lhes defender os bens!

 

Mas será aos bombeiros, e às várias autarquias

Que compete a defesa dos bens privados?

 

Será que nessas alturas nos lembramos

Que  só temos direitos,

E não temos deveres para cumprir,

Ou pelo contrário, só temos deveres,

Como nos querem fazer crer,

De forma permanente, para outras coisas,

E os direitos, são conceitos vagos, escritos

Com tinta invisível,

Cuja lembrança e reconhecimento

Não se aconselha e se esconde.

 

De concreto, quatro vidas de voluntários

Que pararam de modo violento,

 Quando lutavam, não de modo egoísta

Pela defesa dos seus interesses,

Mas sim pela defesa de um património

Que devia ser de todos nós.

 

As homenagens póstumas,

São sinceras, acredito,

Por parte de quase todos.

 

Porque ainda há os outros,

Que com mais ou menos hipocrisia,

Com mais ou menos ar compungido,

Tiram benefícios dos incêndios,

Dos literais, ou dos virtuais

Que contribuem para atear,

E continuam a ver os seus lucros crescer

À custa das desgraças que deliberadamente,

Maquiavelicamente e mafiosamente,

Vão incentivando.

 

E o mais grave, e triste, é que esses

Quase nunca morrem queimados.

 

Eduardo Martins

Carcavelos, 29 de Agosto de 2013 
 
 
 
 
Nas "Noites Com Poemas", quando o Tema foi "O Livro de Jogos de Afonso X" :
 
 
JOGOS, JOGUINHOS E JOGATANAS
 
Como dizia o outro,
Isto anda tudo ligado!
 
O décimo Afonso,
Rei de Leão e Castela,
O tal que mandou fazer
O “Livro de Jogos”,
Veio a ser avô
De D. Dinis, rei de Portugal,
De cognome ”O Lavrador”,
Mas que também foi Rei Poeta…
 
O qual costumava jogar póquer
Com a esposa D. Isabel,
Que fazia “bluff” com ele,
Trocando pães por rosas…
 
Mas o D. Diniz, com a mania
De plantar o pinhal em Leiria,
(Se calhar, para entre os pinheiros
Alguém poder jogar às escondidas…),
Jogou por antecipação:
Preparou a madeira,
Matéria prima para a construção de barcos
De pescas, comércios e descobertas…
 
E se calhar, não prevendo outras jogadas
Bastante mais sórdidas,
Também preparou matéria-prima
Para actividades que muitos séculos depois,
Incentivaram incendiários,
E directa ou indirectamente,
Vieram engendrar joguinhos vários,
De póquer e xadrez em vários tabuleiros,
E outras jogatanas de regras pouco claras,
Em que entram bancas, interesses
Imobiliários e governantes
 De poses angelicais, com as mãos gastas
De tanto as lavar, para tentar escamotear,
Activos tóxicos  monumentais…
 
E nesses jogos, quem sempre perde
São sempre os mesmos, os sempre lixados,
Aqueles que quando o mar continuamente
Vai batendo na rocha,
Já nem se sentem mexilhões…
 
Eduardo Martins
Carcavelos, 20 de Setembro de 2013 
 
 
Para a sessão de Outubro de "Um Poema na Vila" em Coruche, em que o convidado foi Francisco Ceia, apresentando o seu livro "Da Minha Janela", escrevi isto:
 
 
 
 
 
 
 
UM POEMA NA VILA
 
DA MINHA JANELA
 
Da minha janela aberta
Eu sinto o que se passa, lá fora.
E penso como os que passam.
E quem passa, como passa,
Passos certos, ou incertos,
Com profundos pensamentos,
Sobre bons e maus momentos,
Todos eles das várias vidas,
Muito bem ou mal vividas,
Divididas por deveres, e teres
E Haveres, aqueles que hão-de vir,
Prometidos e devidos,
Devidamente esquecidos,
Entretanto
Sabe-se lá quando e como virão,
Se é no Verão, pela torreira do sol?
Se num chuvoso Inverno,
De choroso sofrimento?
Ou num florido momento
De luminosa Primavera?
Se cairão como as folhas,
Dos tapetes do Outono?
 
Pensar tanto e em tanta coisa,
Do que se passa lá fora,
Sem saber a solução,
Provoca-me um vendaval
Mental e um vento real
E antes que a chuva desabe,
Sem ninguém esperar por ela,
E antes que o sol acabe,
E chegue a lua amarela,
Eu sei o que vou fazer:
Vou já fechar a janela
 
 
Eduardo Martins
Carcavelos, 4 de Outubro de 2013