Tenho andado entretido por outras bandas, e a produção poética nem tem sido por aí além...
Aqui vão as mais recentes, ou seja, de Julho para cá...
INCÊNDIOS
E MORTICÍNIOS
Norman Mailer escreveu
sobre
“Os Nús e os Mortos”,
Quando as guerras eram
outras,
E as circunstâncias
diferentes.
O título veio-me à
memória,
Sabe-se lá porquê.
Porque isto anda tudo
ligado,
Ou porque ando a ler
O Jorge Luís Borges,
E as suas Ficções,
E o Aleph, e o Zahir,
E as Bibliotecas
infinitas
De improváveis e
misteriosas origens…
Pensei em “Os Queimados
e os Mortos”,
Mas “Incêndios E
Morticínios”,
Pareceu-me menos
evidente…
Porque para evidências,
já temos que chegue…
Este ano, desde a
abertura da época
Dos incêndios
florestais,
Já morreram quatro
bombeiros.
Ou, sendo politicamente
correcto,
E cumprindo as quotas de
género,
Duas mulheres, jovens,
E dois homens, um mais
velho,
E um jovem,
voluntarioso,
Como voluntários eram
todos,
Aqueles que aderentes a
corporações
De Bombeiros
Voluntários,
Avançaram para combater
Incêndios nas
descuidadas matas nacionais,
Ou nas propriedades Particulares
Daqueles, que não cuidam
delas,
E só se lembram,
Não das Santas Barbaras
Quando faz trovões,
Mas sim quando os fogos
Chegam às suas barbas,
Da “obrigação” de os
bombeiros
(Ou o Estado, ou as
Câmaras,
Ou as Freguesias…),
Defenderem as suas
propriedades
Privadas, com cuja
manutenção
E limpeza nunca se
preocuparam,
Ou porque acreditam que
a desgraça
Só acontece aos outros,
E deixam o mato crescer
e secar e chegar
Até junto às casas onde
vivem e têm
Os seus animais
domésticos,
E as suas alfaias e os
modos
De subsistência do dia a
dia,
Ou porque já não vivem
lá,
E nem sabem o que lhes
pertence,
E só o descobrem quando
O incêndio lhes entra
pela porta dentro.
E aí vêm lamentar-se
(legitimamente?)
Da perda da sua
propriedade,
Porque os bombeiros não
chegaram
A tempo de lhes defender
os bens!
Mas será aos bombeiros,
e às várias autarquias
Que compete a defesa dos
bens privados?
Será que nessas alturas
nos lembramos
Que só temos direitos,
E não temos deveres para
cumprir,
Ou pelo contrário, só
temos deveres,
Como nos querem fazer
crer,
De forma permanente, para
outras coisas,
E os direitos, são
conceitos vagos, escritos
Com tinta invisível,
Cuja lembrança e
reconhecimento
Não se aconselha e se
esconde.
De concreto, quatro
vidas de voluntários
Que pararam de modo
violento,
Quando lutavam, não de modo egoísta
Pela defesa dos seus
interesses,
Mas sim pela defesa de
um património
Que devia ser de todos
nós.
As homenagens póstumas,
São sinceras, acredito,
Por parte de quase
todos.
Porque ainda há os
outros,
Que com mais ou menos
hipocrisia,
Com mais ou menos ar
compungido,
Tiram benefícios dos
incêndios,
Dos literais, ou dos
virtuais
Que contribuem para
atear,
E continuam a ver os
seus lucros crescer
À custa das desgraças
que deliberadamente,
Maquiavelicamente e
mafiosamente,
Vão incentivando.
E o mais grave, e
triste, é que esses
Quase nunca morrem
queimados.
Eduardo
Martins
Carcavelos,
29 de Agosto de 2013
Nas "Noites Com Poemas", quando o Tema foi "O Livro de Jogos de Afonso X" :
JOGOS,
JOGUINHOS E JOGATANAS
Como dizia o outro,
Isto anda tudo ligado!
O décimo Afonso,
Rei de Leão e Castela,
O tal que mandou fazer
O “Livro de Jogos”,
Veio a ser avô
De D. Dinis, rei de
Portugal,
De cognome ”O Lavrador”,
Mas que também foi Rei
Poeta…
O qual costumava jogar
póquer
Com a esposa D. Isabel,
Que fazia “bluff” com
ele,
Trocando pães por rosas…
Mas o D. Diniz, com a
mania
De plantar o pinhal em
Leiria,
(Se calhar, para entre
os pinheiros
Alguém poder jogar às
escondidas…),
Jogou por antecipação:
Preparou a madeira,
Matéria prima para a
construção de barcos
De pescas, comércios e
descobertas…
E se calhar, não prevendo
outras jogadas
Bastante mais sórdidas,
Também preparou matéria-prima
Para actividades que
muitos séculos depois,
Incentivaram
incendiários,
E directa ou
indirectamente,
Vieram engendrar joguinhos
vários,
De póquer e xadrez em
vários tabuleiros,
E outras jogatanas de
regras pouco claras,
Em que entram bancas, interesses
Imobiliários e governantes
De poses angelicais, com as mãos gastas
De tanto as lavar, para tentar
escamotear,
Activos tóxicos monumentais…
E nesses jogos, quem
sempre perde
São sempre os mesmos, os
sempre lixados,
Aqueles que quando o mar
continuamente
Vai batendo na rocha,
Já nem se sentem
mexilhões…
Eduardo
Martins
Carcavelos,
20 de Setembro de 2013
Para a sessão de Outubro de "Um Poema na Vila" em Coruche, em que o convidado foi Francisco Ceia, apresentando o seu livro "Da Minha Janela", escrevi isto:
UM POEMA
NA VILA
DA
MINHA JANELA
Da minha janela aberta
Eu sinto o que se passa, lá fora.
E penso como os que passam.
E quem passa, como passa,
Passos certos, ou incertos,
Com profundos pensamentos,
Sobre bons e maus momentos,
Todos eles das várias vidas,
Muito bem ou mal vividas,
Divididas por deveres, e teres
E Haveres, aqueles que hão-de vir,
Prometidos e devidos,
Devidamente esquecidos,
Entretanto…
Sabe-se
lá quando
e como virão,
Se é no Verão, pela torreira do sol?
Se num chuvoso Inverno,
De choroso sofrimento?
Ou num florido momento
De luminosa Primavera?
Se cairão como as folhas,
Dos tapetes do Outono?
Pensar tanto e em tanta coisa,
Do que se passa lá fora,
Sem saber a solução,
Provoca-me um vendaval
Mental e um vento real…
E antes que a chuva desabe,
Sem ninguém esperar por ela,
E antes que o sol acabe,
E chegue a lua amarela,
Eu sei o que vou fazer:
Vou já fechar a janela…
Eduardo
Martins
Carcavelos,
4 de Outubro de 2013